18 maio, 2008

Criação Artificial

No princípio criou Deus os céus e a terra/'
(Gn 1:1)
"B assim, se alguém está em Cristo, é nova criatura: as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas."
(2 Co 5:17)
Todos, penso, fomos apanhados de surpresa pela Dolly, a primeira ovelha que, segundo os meios de informação, "não tem pai e é geneticamente idêntica à sua mãe genética, uma vez que foi criada a partir de uma das células do corpo de uma outra ovelha, sem a intervenção de qualquer macho."
Nem todos temos a capacidade para perceber as explicações técnicas e científicas que estão no cerne de semelhante operação. Temos a certeza que mesmo aqueles que conseguem compreender esses mecanismos não possuem a mínima ideia das consequências que esta engenharia genética pode vir a provocar a médio e a longo prazo. Veja-se só o que aconteceu durante o regime nazista e reflicta-se no que poderia ter sucedido se, eventualmente, estas descobertas houvessem surgido na altura.
Não pretendemos enveredar por um alarmismo barato, mas também não escondemos que a situação merece uma atenção, análise e decisão firme. Pela parte que nos toca, consideramos que a linha de evolução das sociedades secularizadas e integristas carecem de uma base suficientemente sólida que garanta essa atenção, análise e decisão. Que monstros estaremos em vias de produzir se, a tempo e horas, os cientistas não se dispuserem a obedecer a normas éticas internacionalmente reconhecidas?
A questão ética, todavia, é bem mais pessimista: se não é aceite nenhuma autoridade absoluta em ter-mos éticos e esta está a tornar-se, para um número cada vez maior de pessoas, o que um determinado grupo social pensa num determinado momento, quem poderá impedir um aventureiro, sem escrúpulos, de realizar experiências com seres humanos, para já não falarmos de cruzamentos contra a natureza entre pessoas e animais? Luís Archer, professor jubilado da Universidade Nova, expressou a ideia de que a simples realização de experiências, como a que veio dar origem à ovelha Dolly, é "eticamente reprovável e ofensiva da dignidade humana."
É bizarra, no mínimo, a sociedade que, por um lado, discute o aborto e em muitos países este já foi consignado pela lei civil, discute a eutanásia e enfrenta uma vaga de defensores que também a pretendem ver reconhecida legalmente, e, por outro lado, procura formas diferentes de reprodução da vida.
LINGUAGEM ABUSIVA E SENSACIONALISTA
A forma como esta experiência foi apresentada jornalisticamente está eivada de sugestões totalmente erradas.
Efectivamente não se trata de criação artificial, mas de procriação através de mecanismos distintos daqueles que a natureza encerra. As duas coisas são drasticamente distintas.
O homem não cria artificialmente uma vida, porém usando formas distintas das que na natureza ocorrem, procria uma vida (neste caso com a ausência do macho). Mesmo assim recorre a uma célula onde estão encerradas todas as informações necessárias ao desenvolvimento de uma vida e que é resultado de um ser nascido na relação normal entre macho e fêmea. Ficou-se a saber que não apenas as células do ovo possuem a informação e as potencialidades necessárias ao desenvolvimento da vida, mas também outras existem no indivíduo já desenvolvido que têm a capacidade de retroceder ao pro-cesso de um desenvolvimento desde a origem. O ser assim obtido é uma j fotocópia genética do primeiro. (No I caso do ser humano a duplicação da dimensão genética não se tornaria obrigatoriamente numa duplicação das restantes dimensões da vida já que, todos sabemos, o homem é mais que o seu código genético).
UMA SOCIEDADE CADA VEZ MAIS NO FEMININO (*)
Perfilhamos o ponto de vista bíblico que o homem e a mulher são ambos criação de Deus com características próprias diferenciadas e que se completam, cuja riqueza está na sua diversidade e cujo desafio e aventura reside na sua adaptação e articulação.
Mas a Bíblia aponta claramente para papéis diferentes que não sugerem, não insinuam nem obrigam a qualquer tipo de discriminação, só j para os que assim o querem entender, embora haja uma clara destrinça entre a sua imaginação e vontade, e a intenção do Criador, em que o homem assume a posição de cabeça. Ser cabeça não representa qualquer forma de autoritarismo, porém de cuidado amoroso, de serviço dedicado e abnegado.
A quebra deste princípio espiritual em linha de continuidade com as práticas de mudança de sexo, de "coabitação" entre pessoas do mesmo sexo, tem outro conjunto de repercussões que não são visíveis a olho nu í pela perspectiva natural.
DEUS — CADA VEZ MAIS LONGE?
Mesmo que o homem pudesse chegar ao ponto de criar vida num laboratório a partir, única e exclusivamente, de matéria não viva, ainda assim isso nunca poria em causa a existência de Deus.
Descobertas como aquela de que tomámos conhecimento apenas nos levam a considerar a grandeza da criação da inteligência do homem.
Levam-nos ainda a pensar na estultícia daqueles que, embriagados pela capacidade revelada pela inteligência humana, desdenham dos milagres narrados na Bíblia.
O homem não cria nada no mesmo sentido em que só Deus cria a partir do nada pela Sua Palavra.
Quando o mundo fica atónito perante uma experiência como a que provocou o nascimento da ovelha Dolly, mantém-se incrédulo diante do nascimento de Jesus Cristo de uma virgem...
NOVO NASCIMENTO
Faça o homem o que fizer, o que nunca ele poderá produzir é o novo nascimento que faz do homem e da mulher não apenas uma criatura de Deus, mas um filho de Deus. Para isso é necessário que o Espírito Santo entre no processo com a Palavra de Deus e em função do que Jesus Cristo realizou.
Quando os homens se deslumbram diante das façanhas da engenharia genética, as sociedades, as famílias e as pessoas individuais debatem-se com os problemas da natureza humana como o egoísmo, a inveja, a vingança, o orgulho, a frustração, a solidão, o medo, a rejeição, etc, de onde decorrem a fome, a guerra, a violência, as agressões, o suicídio, a droga, a sida, etc, e que a Bíblia denuncia como tendo a sua raiz na essência espiritual do homem, e que só o novo nascimento pode resolver.
Não há engenharia religiosa, educacional ou qualquer outra que faça o homem nascer de Deus tornando--o um filho do Criador.
Voltam a fazer sentido uma vez mais e sempre as palavras de Jesus Cristo: "Pois, que aproveitará o homem se ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma? Ou que dará o homem em troca da sua alma?" (Mateus 16:26).
O plano de Deus para a salvação, a existência de Deus, a identidade e a obra de Jesus Cristo não são postas em causa por descobertas como esta, mesmo quando alguns teimam em acreditar que já não há mais lugar para elas; com muito mais acuidade, como cristãos, vemos a sua necessidade.
Depois de o ser humano haver já experimentado tudo, desde a política à religião, da economia à técnica, da educação à ciência, passando pela consciência, pela democracia, pela ditadura, etc..., para tentar o Homem Novo; só o novo nascimento nos torna não duplicatas ou fotocópias de Jesus Cristo, mas criaturas que conservam a sua identidade própria; e nessa diversidade a santidade de Deus (incompatibilidade com o mal) que é um dado adquirido e um processo no qual cada cristão está comprometido.
Quando o homem manipula o infinitamente pequeno do átomo e da célula, e perscruta o infinitamente grande do espaço sideral, há um mundo por conquistar e mudar dentro dele próprio que só Deus pode e quer.
Não há lugar para qualquer receio envolvido nessa experiência, porque o modelo que temos em Jesus Cristo é totalmente desejável.
0) Já depois deste texto escrito lemos, num diário da nossa praça, o seguinte: "A experiência da Dolly revela um erro fundamentai do relato bíblico, de que já se desconfiava: não foi Eva que nasceu da costela de Adão, mas este que nasceu da costela de Eva. Somos nós o suplemento." Acreditamos que uma afirmação como esta tem mais de humor e ironia do que de sério, e só assim pode ser entendida. O relato genésico da criação da mulher, com tudo o que comporta de riqueza simbólica, não foi certamente clonagem por muito que os feminismos assim o pretendam, mas também não pressupõe qualquer diminuição de valor como os machismos gostariam de entrever. Tanto homem como mulher são criação de Deus diferentes nas suas qualidades e atribuições, contudo iguais no seu valor e dignidade. Nada de competição mas, isso sim, complementaridade.
Autor do Artigo :
SAMUEL R. PINHEIRO

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