25 maio, 2008

Alargando a tenda

O pastor Delfim Campos Cordeiro proferiu uma extensa mas oportuna mensagem em Outubro do ano passado, na Convenção das Assembleias de Deus em Portugal, ocorrida em Queluz. O autor deu à comunicação o título "Alargando a Tenda", inspirando-se nos textos bíblicos de Isaías 54:2 e Mateus 16:18.
Publicamos aqui parte da mensagem que interessa com certeza aos crentes e dirigentes das nossas igrejas — N. da R.
No livro do profeta Isaías consta a expressão "amplia o lugar da tua tenda", e no Evangelho segundo Mateus registam-se as palavras do Senhor Jesus: "edificarei a minha igreja".
A PROPÓSITO DE CRESCIMENTO
"Alargar a tenda" implica crescimento da família com o nascimento de novos filhos. E a propósito de filhos, recordo as palavras de Raquel: "Dá-me filhos, ou se não morro" ('). Hoje também há um grito por crescimento da igreja, e nessa ânsia muitos entraram por processos errados e por doutrinas contrárias à Palavra de Deus, corrompendo-se e corrompendo a igreja em nome desse crescimento.
O Senhor Jesus avisou que é preciso edificar sobre a rocha (2), a propósito dos falsos profetas. Paulo adverte: "Veja cada um como edifica" (3). O crescimento fácil é menos trabalhoso e tem menos custos, só que não dura tanto. Mau ou bom, todo o crescimento será sujeito ao teste divino, e os autores dessa obra ficam sujeitos, respectivamente, à condenação ou à aprovação.
Uma coisa é certa: todo o crente nascido de novo terá de ser fruto da dor e das lágrimas duma igreja, qual mulher grávida que sofre até dar à luz um filho, e, nascido este, alegra-se por haver entrado mais um ser na família de Deus (4).
Todo o crescimento origina alegria, como Jesus disse: "Há alegria diante dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende" (s). A diminuição traz tristeza: a ovelha perdida, a moeda perdida, o filho perdido. Nas parábolas de Jesus, o coração do pastor, da mulher e do pai não descansaram até reaverem a ovelha, a moeda e o filho que se haviam extraviado.
Não sei se cada pastor fica sossegado por uma ovelha ou por um filho que diminui no rebanho e na família de Deus. O que sei é que se queremos ver mais filhos a "nascerem", precisamos ter mais dores e chorar mais lágrimas (6).
Alargar a tenda foi a visão da Igreja Primitiva (7). Alargar a tenda deverá ser a nossa visão hoje. Temos deparado com muitos obstáculos, e perdemos muitos recursos e muitas das nossas forças, sem resultados.
Necessitamos de abrir uma nova página na nossa história e não repetir erros que cometemos no passado recente. Deus requer de nós humilhação e um novo propósito, se desejamos ser usados na gigantesca obra que Ele tem para realizar.
A Obra actual será de grandes dimensões se todos agarrarmos a visão. Esta é a oportunidade de se apresentar alguns pontos, os quais ajudar-nos-ão a ver o passado, a tomar consciência da nossa responsabilidade como ministros de Deus no presente, e a olhar para o futuro com uma visão clara e objectiva.
OBSTÁCULOS INTERNOS DA IGREJA
1. RELACIONAMENTO. Sem um bom relacionamento na igreja não há condições para se avançar. É importante o relacionamento entre pastor e igreja.
O pastor é o obreiro da justiça, da paz. da unidade, do amor e da compaixão na igreja. Se a igreja não vê isto no seu pastor, dificilmente se mobiliza face aos apelos para o serviço divino. Não há condições para tal (8).
As acções e as palavras do pastor terão de ser bem medidas e premeditadas a fim de se não criarem focos de conflituosidade e de separação entre os membros. Se há quebra de comunhão entre os membros, torna-se indispensável todo um trabalho de sofrimento para recuperá-los. O pastor não pode esquecer-se que cada pessoa é importante na igreja.
Sem uma igreja verdadeiramente unida não existe genuíno crescimento (s).
2. FALTA DE ESTRATÉGIA, a) E mister um plano de acção para alcançar os desviados.
Semelhante atitude enche a igreja de alegria e gosto pelo trabalho de ganhar almas, porque demonstra o valor e o apreço dos seus lideres pelas pessoas. Os crentes sabem avaliar a importância que têm no conceito dos seus dirigentes, e agem a partir de tal premissa.
Preparar a igreja para o serviço é estimular e não criticar, é honrar e não inferiorizar. Se um servo de Deus se sobrevaloriza, a igreja sentir-se-á sobrevalorizada. E uma igreja valorizada sente prazer no trabalho.
Para o pastor fazer o rebanho crescer e fortalecer-se Ç°) necessita de buscar as ovelhas desgarradas, curar as feridas, apascentar as famintas e fortalecer as fracas.
b)São precisos programas evangelísticos. Temos de estar contextualizados na nossa época, de modo a transmitir-se o evangelho e alcançar as pessoas. Não se pode mudar o evangelho, mas deve-se mudar a forma de o apresentar. Essencialmente as pessoas de hoje têm as mesmas necessidades que as de outrora, todavia, os problemas são outros, bem como a maneira de ver as coisas e estar na vida.
É necessário apresentar a Palavra de Deus no poder do Espírito Santo. Temos de ser mensageiros proféticos. O êxito da evangelização consiste em basearmo-nos na Palavra: "Está escrito". Temos de verificar se cremos no que pregamos. Deus vela pela Sua Palavra para a cumprir (").
c) É preciso oração e que brandamente (,J). Hoje requer-se que brantamento, a começar pela liderança. Não basta orar ("). Não basta jejuar (,4). Orar por exibição de nada serve. Jejuar só por si, não chega. Todo o jejum que não quebrantar, que não criar um novo carácter, que não nos encher de humildade e amor pelo próximo, não serve! O profeta Isaías é claro nisso (,s).
3. FALTA DE ENSINO, a) O ensino deve ter em vista que todo o povo se sinta responsável pelo trabalho. Toda a igreja deverá ministrar (16).
b) O ensino verdadeiro destina-se a criar pessoas à imagem de Cristo, e não à imagem do pastor ("). Os crentes não são cópias dos pastores, nem cópias uns dos outros. Se algum pastor quiser fazer isso, matará todas as capacidades e aniquilará todo o prazer do serviço.
c) É preciso ter em conta as diferentes personalidades, as várias capacidades e a individualidade de cada um (16). O apóstolo Paulo ensina que a diversidade constrói a unidade, utilizando o exemplo do "corpo". Ninguém consegue a unidade levando as pessoas à uniformidade. Isso resulta em rejeição.
4. FALTA DE EXEMPLO DOS LÍDERES, a) Toda a liderança carece de acção espiritual, o que nem sempre sucede.
b) Quando a liderança não revela espiritualidade e amor pelas almas, não há inspiração para os crentes serem activos e ganhadores de almas.
c) Muitos ministérios das igrejas não desempenham minimamente o seu papel e não funcionam conforme o título que possuem.
d) Um mau exemplo de liderança é a igreja ver que os dirigentes não se interessam pelos desviados, pelos doentes, pelos velhos, pelos desfavorecidos, etc.
e ) A igreja perde o gosto pelo trabalho quando vê cada um buscar os seus interesses.
5. FALTA DE CONDIÇÕES NA IGREJA, a) A igreja necessita de condições espirituais e morais para receber novas pessoas. A igreja é um lar. Haverá pais espirituais e irmãos para concretizarem o objectivo de Jesus, quando o Senhor disse: "Edificarei a minha igreja". Terá de haver suprimento que satisfaça as carências das pessoas vindas do mundo. A igreja pode chamar-se "igreja", sem funcionar como igreja.
b) A igreja é um hospital equipado. Nesse "hospital" há nascimentos, há cuidados, há alimento adequado, há higiene e saúde.
c) Exige-se da igreja uma vida plena de união, de justiça, amor, paz, compaixão, confiança entre os membros, e dos membros para com a liderança. Os novos crentes apercebem-se depressa da coerência ou incoerência entre o que se prega e o que se vive.
RECURSOS NÃO APROVEITADOS
Temos cometido alguns erros em não saber aproveitar as novas gerações, especialmente os jovens que. em muitos casos, se nos apresentam disponíveis e desapegados. Não soubemos mobilizá-los. convertendo a sua força numa grande investida evangelística.
Uma razão também para a decadência e falta de "alargamento" da igreja é o vazio entre duas gerações. A primeira geração está cansada; a segunda geração não tem sido convenientemente aproveitada.
O valor da primeira geração era a espontaneidade para dar testemunho em qualquer lugar. O valor da segunda geração é um intelecto mais desenvolvido e com vontade de actuar mais organizadamente.
A primeira geração passou com toda a sua força evangelizadora. A segunda geração poderá perder--se. por nossa culpa, com todo o seu potencial, pelas razões a seguir mencionadas.
1. Receamos que o conhecimento intelectual tire o lugar ao Espírito Santo.
2. Desconfiamos muitas vezes da sinceridade da mocidade.
3.Nem sempre damos oportunidade aos jovens com medo de nos ultrapassarem pelo seu conhecimento.
4. Não aproveitámos devidamente os inúmeros jovens que vieram até junto do púlpito, com lágrimas, para se consagrarem a Deus. em Congressos e Conferências, deixando-os muitas vezes na frustração pela nossa incoerência (Chamamos, e não apoiamos).
5. Não soubemos organizar e mobilizar os rapazes e as moças em campanhas de evangelização, e não os acompanhámos no seu sincero desejo, perdendo deles a confiança.
Há outros recursos mal aproveitados, ou nada aproveitados na maioria dos casos. Refiro-me aos profissionais cristãos.
Quantos profissionais crentes temos que podem evangelizar nas suas áreas especificas? São educadores de infância, professores dos vários graus de ensino, engenheiros, advogados, médicos, enfermeiros, arquitectos, construtores civis, empresários, contabilistas, psicólogos, músicos, estudantes, etc.
Sabemos que muitos desejam servir, e não sabem como. Ninguém os mobiliza. Alguns querem sair do seu lugar, e até do pais. para fazerem um trabalho cristão — a par da sua profissão —. mas não têm quem os encaminhe. Reflectindo nisso, propõe-se o seguinte:
1. Faça-se um inquérito junto das igrejas a fim de se saber quantos desses profissionais temos congregados. Organize-se um ficheiro próprio, com todos os dados, para ficar no arquivo de Missões.
2.Realize-se uma Conferência só de profissionais cristão, com as suas intervenções e as nossas, ouvindo dos seus desejos e da sua visão para o serviço de Deus. Esta e outras Conferências visam sobretudo Missões e Evangelização, numa perspectiva profissional. Deverá ser integrada uma grande acção social.
3. Organizem-se grupos de trabalho dos diversos sectores profissionais e um coordenador em cada grupo.
4. Apoiem-se tais grupos de trabalho, fazendo-se constar os mesmos num boletim missionário que deverá existir entre nós.
Esses profissionais cristãos precisam de ser apoiados pelas igrejas e pela Convenção das Assembleias de Deus em Portugal. Tal "movimento" dará informações na Convenção e nas Conferências Nacionais.
O aproveitamento desses servidores poderá ser um meio de alargamento da Obra do Senhor, tanto no pais como no estrangeiro, e certamente um motivo de regozijo e inspiração.
ALARGAMENTO DA TENDA
Para se alargar a "tenda" hoje é necessário recriar o espírito de pioneirismo e dar lugar a quem possua a chamada de Deus. Em principio, devemos confiar nos candidatos que se nos apresentam com o forte desejo de servir ao Senhor. É mister fazer uma mobilização geral que envolva todas as forças vivas da igreja, como a seguir se refere.
1. Dinâmica juvenil. Grupos em fins de semana e apoiados pelas igrejas e Departamento de Missões.
2. Ministério das mulheres. Mulheres utilizadas como evangelistas constantes nas igrejas. Visitação e apoio. Serviços de auxílio e socorro.
3. Mobilização dos profissionais. Organização sectorial dos profissionais crentes. Acção evangelística e social dos mesmos. Promoção da igreja no exterior mediante os profissionais cristãos.
4. Evangelização infantil e juvenil. Jovens com uma chamada específica. Música, desenho, literatura, vídeos, etc. apropriados para crianças, adolescentes e jovens.
5. Centros missionários coordenados. Centros com grupos de obreiros, excedentes ou não. Apoio das igrejas e Departamento de Missões. Trabalho evangelístico e colportagem. Abertura de portas ao Evangelho em lugares novos. Estímulo para as igrejas envolventes.
6. Recrutamento de leigos (cooperadores) nas igrejas. Despertar a voluntariedade dos cooperadores, algo que se está a perder. Seminários nas igrejas para tais servidores. Criação de manuais de auxílio doutrinário.
7. Desafio ao testemunho pessoal. Dar ênfase novamente ao testemunho em família e perante os amigos. Estimular toda a igreja quanto ao serviço. testificar nos cultos a fim de incentivar a fé.
Tudo isto não impede as tradicionais Campanhas Evangelistas com todo o seu bom impacto e resultados positivos.
Os programas de rádio são também um meio a não desperdiçar. A televisão poderá ser um forte veículo, se bem usada.
O Evangelho hoje não pode ter um sabor a velho, mas um sabor a novo, como única resposta aos problemas da sociedade moderna. A Igreja carece de se contextualizar de modo a penetrar em todos os sectores da sociedade moderna.
Finalizo esta mensagem com as palavras de Isaías: 'Amplia o lugar da tua tenda, e as cortinas das tuas habitações se estendam;, não o impeças; alonga as tuas cordas, e firma bem as tuas estacas" (1S
Autor do Artigo ;
DELFIM CORDEIRO

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