08 agosto, 2006

O Evangelho, poder de Deus - 1ª Parte

Pois não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego. Rm 1.16

Tenho me convencido firmemente que a afirmação de Calvino: "a verdadeira sabedoria se divide em duas partes: o conhecimento de Deus e o de nós próprios" é extremamente acertada. Gostaria, aqui, de refletir com os irmãos como a compreensão que temos acerca do homem e de Deus pode afetar o que entendemos acerca do significado desta importante palavra: Evangelho. Vejamos, então, o que ensinava um evangelista do século passado, Charles Finney, que foi o criador do chamado Sistema de Apelo. Talvez poucos hoje conheçam detalhes de sua doutrina mas seus método são imitados a tal ponto que muitos não conseguem imaginar outra maneira de evangelizar. Quero enfatizar que não há método de evangelismo sem uma doutrina que o sustente. Portanto é importante examinar o que Finney cria.

Em primeiro lugar Finney acreditava que Deus é soberano somente no mundo físico, mas não no reino moral. Aí Deus se encontra limitado pelo livre-arbítrio do homem, de tal forma que o Seu poder sobre o homem fica reduzido somente à persuasão. Declarou Finney: é inútil falar da onipotência de Deus para impedir o pecado. Então a única coisa que Deus pode fazer é apresentar à mente do homem as bênçãos e vantagens de se aceitar o evangelho sendo este o objetivo da pregação: persuadir o homem da forma mais apropriada que se possa lançar mão. A graça tornou a salvação segura para qualquer ser humano que possa ser persuadido a aceitar a oferta da salvação, e isso por meio de todas as influências de que Deus possa, sabiamente, lançar mão.

Assim a graça tornou a salvação possível a todos e eficaz para ninguém! A função do Espírito Santo é obter e cativar a atenção da mente. Deus e Satanás competem pelo prêmio, e, nesta atividade o Espírito pode tanto ter vitória quanto ser derrotado.

Finney acreditava, também, que a mente humana era neutra, não possuindo caráter moral. Falar que atos pecaminosos são fruto de um interior pecaminoso era, para Finney, sem sentido. Uma das primeiras verdades racionais é que o homem não pode estar debaixo de qualquer obrigação moral para fazer algo que seja totalmente impossível de ser feito dizia Finney. Com base nisso Finney criticava qualquer oração que pedisse a Deus que ajudasse os pecadores a se arrependerem. Para ele era um insulto a Deus pedirmos que Deus ajudasse os homens a fazer o que Ele havia ordenado, porque isso sugeria que sem a ajuda de Deus os homens não o fariam e, se fosse dessa forma, Deus seria um tirano.

Portanto, para Finney, o pecador tem o poder de regenerar-se a si mesmo e a palavra de Deus somente mostra como fazer isso. O pecador converte-se a si mesmo, o Espírito Santo somente persuade-o a faze-lo. Portanto o sistema de apelo: a salvação está ao seu alcance agora, você pode obtê-la nesse instante. Só depende de você. Essa é a conclusão lógica de uma visão de um Deus limitado e de um Homem supervalorizado.

Volte, agora, para o versículo citado no início. Paulo afirma que o evangelho é PODER ... Você consegue ver o PODER de Deus para a salvação nesse "sistema teológico". É esse o verdadeiro evangelho? Deus, de fato, é soberano apenas no mundo físico? A soberania de Deus é limitada pelo livre-arbítrio do homem? Essas são perguntas cruciais, e dependendo do modo como você as responda a sua compreensão dessa palavra -- Evangelho -- será grandemente afetada.

Mas quero prosseguir e mostrar alguns perigos que acompanham este "sistema teológico":

O perigo de obter conversões meramente psicológicas. Um pregador com uma personalidade cativante, um ambiente em que uma música suave toca no fundo, um apelo para se encontrar com a paz, segurança, alegria... dezenas de pessoas indo à frente e sendo abraçadas por conselheiros espalhados pelo auditório... deve ser verdade o que o pregador está dizendo... veja aquelas pessoas chorando... tem que ser verdade... e após uma oração de "entrega" a pessoa deixa o altar informada que agora é cristã, mas na segunda-feira ela percebe que não mudou nada. Cito como exemplo uma igreja que participou de uma cruzada Billy Graham recebeu o nome de 16 pessoas que haviam se "convertido". Durante as visitas feitas pelos conselheiros nenhuma delas revelou interesse pela igreja, pela Bíblia ou pela fé cristã.

O perigo de fornecer segurança àqueles que permanecem sem se converterem. Você nunca se intrigou com aqueles "convertidos" que permanecem sempre carnais. O que dizer desses que se "decidiram" por Cristo mas não estudam a Palavra, não seguem os seus preceitos, não se importam se estão ausente quando ela é pregada, por qualquer motivo se melindram e desaparecem da igreja? Você já considerou a possibilidade de que eles nunca se converteram? E como isso é sério. Muitos pregadores protestantes, por suprema ironia, estarão se equiparando a Tetzel, o monge dominicano que serviu de estopim para a Reforma. Quantos que receberam a certeza de salvação com a compra de indulgências não farão companhia no inferno a muitos que receberam a certeza da salvação por parte de pregadores protestantes. Isso porque o evangelho que tem sido pregado é produto de invenção humana tanto quanto as indulgências vendidas por Tetzel. Meus irmãos, sejamos demorados a dar segurança da salvação aos nossos ouvintes. Ouçam a advertência do grande metodista, George Whitefield: Fico feliz que vocês saibam quando as pessoas são justificadas. É uma lição que eu ainda não aprendi. Existem tantos ouvintes de solo pedregoso, os quais recebem a Palavra com alegria, que eu decidi suspender meu julgamento até que venha a conhecer a árvore por seus frutos... Isso me faz ser muito cauteloso, o que eu não era há trinta anos atrás, em considerar as pessoas como realmente convertidas. Eu gosto muito de esperar um pouco e ver as pessoas produzirem fruto; pois existem diversos brotos que os ventos de março vão derrubar, de forma que não posso crer que eles sejam verdadeiramente convertidos até que eu veja os frutos retornarem; e isso não fará nenhum mal a uma alma sincera.

Também o grande evangelista do século passado, Charles Spurgeon nos adverte: Freqüentemente acontece que aqueles convertidos que nascem em momentos de excitação, morrem quando esta passa... Alguns dos maiores pecadores que conheci eram membros de igreja e foram, segundo creio, levados a fazerem uma profissão de fé sob uma pressão indevida, pressão essa bem intencionada, porém mal avaliada. E em outro lugar: Algumas vezes somos inclinados a pensar que uma boa parte do avivalismo moderno tem sido mais instrumento de maldição do que de bênção, uma vez que tem conduzido milhares de pessoas a algum tipo de paz, antes que elas tenham conhecido suas misérias; restaurando o filho pródigo à casa do Pai sem antes levá-lo a dizer: Pai, pequei contra ti.

Na semana que vem, com a graça de Deus, voltaremos a este tema.

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Culto BNDES - 28.02.96

O Evangelho, poder de Deus - 2ª Parte

Túlio Cesar Costa Leite

Na semana retrasada procurei mostrar como o conceito que temos da palavra evangelho é afetado por aquilo que cremos a respeito de Deus e também do homem. Vimos que quase toda a prática do evangelismo moderno deriva do ensino de um evangelista famoso no século passado - Charles Finney. Mostramos que Finney ensinava que Deus era onipotente somente no reino físico e que no reino moral sua soberania era limitada pelo livre-arbítrio do homem. Finney declarava que era inútil falar da onipotência de Deus para impedir o pecado. Finney ensinava também que o homem era absolutamente capaz de fazer tudo aquilo que Deus requeria dele sem qualquer ajuda divina e dizia que não deveríamos pedir que Deus ajudasse os pecadores a se arrependerem. Para Finney o pecador tinha o poder de regenerar-se a si mesmo e a palavra de Deus somente mostraria como o homem poderia fazê-lo. O pecador poderia converter-se a si mesmo, o Espírito Santo somente persuadiria o homem a fazê-lo. Finney também dizia que a mente humana era neutra e Deus e o diabo disputam a posse dela. Nessa luta a única coisa que Deus pode fazer é persuadir o homem a aceitar a oferta da salvação, e isso por meio de todas as influências de que Deus possa, sabiamente lançar mão. A função do Espírito Santo seria obter e cativar a atenção da mente. E, é claro, nessa disputa, Deus poderia ser vitorioso ou perdedor. Para Finney, a salvação está ao alcance do homem agora. O homem pode obtê-la nesse instante. Questionamos então onde, no ensino de Finney, está o poder de Deus?

Vimos, também, os perigos que este sistema teológico acarreta:

- O perigo de obter conversões meramente psicológicas.

- O perigo de fornecer segurança àqueles que permanecem sem se converterem.

Vamos avançar e mostrar:

O perigo de uma mensagem centralizada no homem. Um pastor, na pregação leu o texto: "mulher por que choras (Jo 20.11-18). Sem analisar o contexto o pastor pergunta à assistência: Quais são suas necessidades? Porque você chora? Se você está triste, Jesus é a nossa alegria. Se você está sem paz Jesus é nossa paz... sem segurança? Jesus é nossa segurança... sem esperança? Jesus é nossa esperança... Vamos agora cantar um hino para preparar os ambientes e os corações.

Após o hino, faz-se o apelo. As pessoas vão à frente e após uma oração "de entrega" são informadas que agora são cristãs.

Mas essa é uma mensagem centrada nas necessidades humanas e que tende a esconder as partes "duras" do evangelho: "Se não crerdes que eu sou morrereis nos vossos pecados (Jo 8.24). Jesus morreu por nossos pecados: 1 Co 15.3. Você já reparou que o pecado na Bíblia é uma questão central? E que na maior parte das pregações evangelísticas ele e tratado de maneira incidental ou secundária. Mensagens que não põem em evidência -- entre tantas singularidades do Cristianismo em comparação com as outras "religiões" -- que o Cristianismo é fundamentalmente uma religião para pecadores.

Você é pecador? O sentimento de que a sua vida o torna odioso a Deus já o abateu? Você já clamou desesperado: maldito homem que sou!? Então o Cristianismo é para você!

O perigo de uma mensagem que retira a glória de Deus e a dá ao homem

Tenho em minhas mãos um folheto intitulado "Bom Dia" que passo a ler para vocês:

Quando você levantou pela manhã EU já havia preparado o sol para aquecer o seu dia, e o alimento para sua nutrição. Sim, EU providenciei tudo isso enquanto vigiava o seu sono, a sua família e a sua casa. Esperei pelo seu Bom Dia, mas você se esqueceu. Bem, você parecia ter tanta pressa que EU lhe perdoei.

O sol apareceu, as flores deram o seu perfume, a brisa da manhã o acompanhou e você nem pensou que EU é quem havia preparado tudo isso. Seus familiares sorriam, seus colegas o saudaram, você trabalhou, estudou, viajou, realizou negócios, alcançou vitórias, mas... você não percebeu que EU estava cooperando com você, e mais teria ajudado se você me tivesse dado uma chance...[!]. EU sei, você corre tanto... EU o perdoei.

Você leu tanto, ouviu muita coisa, viu mais ainda, e não teve tempo de ler ou ouvir a MINHA PALAVRA. Eu quis falar, mas você não parou para ouvir. EU quis até aconselhá-lo, mas você nem pensou nesta possibilidade. Seus olhos, seus pensamentos, seus lábios seriam melhores. O mal seria menor e o bem, muito maior em sua vida.

Você trabalhou, ganhou dinheiro, não fez mais porque não me deixou ajudá-lo. Mais uma vez você se esqueceu de mim.

Esqueceu-se de que EU desejo uma participação no meu reino com a sua vida e o seu talento.

Findou o seu dia. Você voltou para casa. Mandei a lua e as estrelas tornarem o cenário mais bonito para lembrar-lhe do meu amor por você. Certamente, vai agradecer-me e me dar uma Boa Noite... Já dormiu! Que Pena!

Boa Noite, durma bem. Eu ficarei velando por você.

JESUS.

Meus irmãos, eu quero afirmar que este Jesus que mais parece um animalzinho abanando o rabo com os olhos tristes, implorando por um afago do seu dono, não é o JESUS que conheço nas páginas da Bíblia! Quão feliz esse "jesus" ficará se alguém se dignar a dar-lhe atenção! Ora, este amor sentimentalóide, choroso, não é o amor daquele que veio BUSCAR E SALVAR O PECADOR. O JESUS da Bíblia não fracassa no seu objetivo. E também é cheio de glória. Lembra-se de João, aquele que reclinava a cabeça no peito de JESUS? O que acontece quando ele tem, em Patmos, uma visão de JESUS glorificado? Quando o vi, caí a seus pés como morto. Porém Ele pôs sobre mim a mão direita, dizendo: não temas; eu sou o primeiro e o último e aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos e tenho as chaves da morte e do inferno.

Uma mensagem que quer a todo custo e a qualquer preço obter a conversão dos homens retira a glória de Deus. O evangelho não é somente de atração mas também de repulsão. Muitos dos seus discípulos, tendo ouvido tais palavras disseram: Duro é este discurso; quem o pode ouvir?... Isto vos escandaliza? ... as palavras que eu vos tenho dito são espírito e vida. Contudo há descrentes entre vós... E prosseguiu: Por causa disto, é que vos tenho dito: ninguém poderá vir a mim, se, pelo Pai não lhe for concedido. À vista disso, muitos dos seus discípulos o abandonaram e já não andavam com ele. (Jo 6.60ss).

Finalizando, qual a alternativa? Volte ao texto que lemos no início: Pois não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego. É uma fé simples no poder da Palavra para converter os pecadores. A Palavra não precisa de nenhum acréscimo humano para torná-la mais atraente ou mais poderosa ou mais qualquer outra coisa. Ela já tem a chancela do Todo-poderoso. Simplesmente preguemos A PALAVRA, toda ela sem omissões. Já estudou sobre a Reforma, como ela se espalhou como um rastilho de pólvora pela Europa? Qual o segredo? Ouçam Martinho Lutero! "Simplesmente ensinei, preguei, escrevi a PALAVRA de Deus; não fiz mais nada. E então, enquanto eu dormia, ou bebia cerveja de Wittenberg com meu Filipe e meu Amsdorf, a PALAVRA enfraqueceu tão intensamente o papado que nenhum príncipe ou imperador jamais fez estrago assim. Não fiz nada. A PALAVRA fez tudo."

O que fazer quando ninguém dá atenção à PALAVRA? Nesse caso, quando o "plano A" falha não há um "plano B". Se você se certificar que está, de fato, pregando A PALAVRA, continue. Porque "Deus honra a pregação que o honra". Finalmente os convertidos aparecerão. Os verdadeiros convertidos. Certa vez Spurgeon encontrou um bêbado que lhe disse: Sr. Spurgeon, não me reconhece? Sou um de seus convertidos! Ao que prontamente Spurgeon respondeu: Certamente que você é um de meus convertidos. Se tivesse se convertido a Jesus não estaria nesse estado!... Cuidemos para que o nosso trabalho, depois de tanto esforço, ao passar pelo fogo, não se revele "palha, madeira e feno". Que ele seja permanente. E esta qualidade só pode ser obtida pelo poder de Deus e não pelo esforço humano.

Quem sai andando e chorando, enquanto semeia, voltará com júbilo, trazendo os seus feixes.

Enquanto isso, acrescentava-lhes o Senhor, dia a dia, os que iam sendo salvos.

Sl 126, At.2

AMÉM!


औटर दो अर्तिगो

Culto BNDES - 14.02.96

Túlio César Costa Leite

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